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triticultura brasileira

19/06/2012
A triticultura brasileira evoluiu muito nas últimas décadas. Iremos demonstrar aqui os principais avanços já alcançados e também aqueles em que devemos mais nos empenhar. Dentre todos destacaremos os avanços no rendimento de grãos e na qualidade industrial que são os mais importantes para o triticultor. Os outros avanços tendem sempre a se refletir no rendimento e/ou na qualidade. Rendimento de grãos cresce 200% A produtividade do trigo na região Sul do Brasil evoluiu nos últimos 35 anos de em torno de 600 kg/ha para acima 2.500 kg/ha. Este avanço se deve a uma série de fatores que acumulados nos trouxeram até o patamar atual. Inicialmente vale destacar o melhor entendimento ocorrido ainda na década de 1970 da importância da rotação de culturas para diminuição de doenças como o Mal-do-Pé, as podridões radiculares e as manchas foliares no trigo. A adoção desta prática permitiu diretamente melhorar a produtividade. Infelizmente, lutamos ainda hoje para que a rotação de culturas seja mais amplamente adotada, principalmente na região Oeste do Rio Grande do Sul que ainda planta mais de 50% da área de trigo onde na safra anterior se cultivou trigo (trigo sobre trigo) A rotação mais adequada permitiu não só o aumento do rendimento nas lavouras, mas possibilitou também que os programas de melhoramento obtivessem condições de seleção onde um potencial de produtividade muito maior fosse expresso. Desta forma, cultivares cada vez mais produtivas se sucederam desde então. Inicialmente, tivemos um grande avanço com a cultivar BR-23, que no nosso entender foi a primeira que claramente se beneficiou da melhoria da rotação. Depois podemos citar muitas outras cultivares, de diversas instituições de pesquisa, todas marcantes na triticultura da região Sul, tais como: Embrapa 16, CD-104, Ônix, Fundacep 52, e mais recentemente Quartzo, que foi lançada em 2008 e ainda é a mais cultivada atualmente. Já podemos vislumbrar, no entanto, novas cultivares como o TBIO Sinuelo (lançamento 2012) com produtividade de aproximadamente 300 kg/ha superior a Quartzo. É possível exemplificar também que no Ensaio de Cultivares Registradas no Rio Grande do Sul, conduzido pela Fundação Pró-Sementes em 2011, as oito cultivares mais produtivas foram todas lançadas nos últimos quatro anos indicando que as cultivares mais recentes continuam a suplantar as lançadas anteriormente, como não poderia deixar de ser. Vale observar também que embora a média das lavouras tenha recém passado dos 2.500 kg/ha, na experimentação (neste caso do Rio Grande do Sul) se obteve cultivares com mais de 5.800 kg/ha e uma média de todas as cultivares registradas de 4.748 kg/ha. Isto indica que muito do que sabemos fazer não conseguimos ainda implementar em larga escala e, portanto, temos que redobrar os esforços para que a tecnologia disponível chegue ao maior número de lavouras. A consolidação do plantio direto nas últimas décadas foi outro fator marcante no aumento do rendimento. Com a diminuição severa da erosão e com o aumento dos níveis de matéria orgânica observados em muitas regiões, a capacidade produtiva de nossos solos foi potencializada, exigindo cultivares com maior resistência ao acamamento e, inclusive, possibilitando o sucesso comercial de reguladores para diminuir o acamamento. Falando em produtos, não podemos deixar de registrar a melhoria ocorrida nas diversas linhas de defensivos agrícolas para o trigo. Hoje temos herbicidas e inseticidas mais eficientes e mais seletivos, assim como fungicidas mais eficazes e de maior período residual. Neste caso, foi marcante a chegada dos triazóis e mais recentemente das estrobilurinas. Estas últimas tem inclusive mostrado auxiliar na produtividade, mesmo na ausência de doenças. Podemos também esperar nos próximos anos o lançamento de fungicidas inovadores. Embora o mercado de trigo não seja o foco da maioria das empresas, estas têm investido muito no desenvolvimento de novas moléculas impulsionadas pela corrida disputa pelo milionário mercado de produtos para a ferrugem da soja. Uma vez desenvolvidas para a soja e outras culturas, muitas destas novas moléculas acabam beneficiando também a cultura do trigo. Do público ao privado Até o começo da década de 1990, quando a comercialização do trigo foi desestatizada, a qualidade do trigo brasileiro era secundária. Isto ocorria, pois o governo era o único comprador de trigo e único fornecedor dos moinhos. Uma vez que todos recebiam aproximadamente a mesma matéria prima não havia concorrência livre para priorizar melhor qualidade. Isso mudou drasticamente quando os moinhos ficaram livres para escolher o que queriam comprar. Naturalmente, o melhor passou a valer mais – ou de forma mais realista – o pior passou a valer menos. A pressão por qualidade começou e muitas cultivares com potencial agronômico interessante foram descartadas no intuito de melhor suprir o mercado. Paraná e São Paulo que já plantavam trigos de razoável força de glúten (origem mexicana), logo passaram a cultivar quase somente trigos de boa qualidade de panificação, conhecidos como trigos de classe Pão e/ou Melhorador. O Rio Grande do Sul foi o último claramente a rejeitar trigos de pouca força de glúten (classe Brando – agora chamados de Básico). O Estado fez isto após duas safras com muita dificuldade de comercialização. Atualmente, mais de 95% das cultivares semeadas no Brasil tem boa aptidão para panificação que é o principal destino do trigo nacional. Farinhas com aptidão para biscoitos, bolos, macarrão e outros usos são também necessárias e tudo indica que estas demandas menores terão de ser atendidas via produção contratada ou formas similares de produção mais controlada. Mudando a qualidade do que se planta Para melhor ilustrar as mudanças pelas quais passamos em termos de qualidade utilizaremos o trigo gaúcho como modelo, pois foi este o que mais mudou. No momento da desestatização dos anos 1990, o Rio Grande do Sul cultivava principalmente trigos suaves de cor branqueadora como a cultivar BR-23. Estes tinham qualidade até adequada para produção de biscoitos e bolos, mas não para panificação. Por consequência, a oferta maior que demanda resultava em percepção de má qualidade. Na sequência, cultivaram-se trigos como Embrapa 16, CEP 24 e Rubi que atendiam a demanda de panificação de forma razoável, mas que perderam área para outros trigos como Pampeano e Fundacep 52 que eram mais interessantes no campo. Como não havia pagamento diferenciado por qualidade, este tipo de cultivar prosperou em detrimento de cultivares de melhor qualidade, mas de menor apelo agronômico. Recentemente, o reconhecimento do mercado da necessidade de melhor qualidade e a disponibilidade de cultivares de classe Pão mais competitivas como Quartzo, BRS Guamirim e Fundacep Horizonte possibilitou o crescimento da área destas e outras de classe Pão. Neste contexto, e devido também a características de resistência a manchas foliares e germinação na espiga, a cultivar Quartzo se tornou a mais cultivada no RS e no País. Neste momento, havíamos melhorado muito a qualidade das proteínas produzidas por nossas cultivares visando à produção de trigo para panificação tendo um mínimo 180 pontos (10-4 joules) de Força de Glúten (W) exigido para compra governamental como trigo Pão. Eis que novamente se aumentou a exigência por qualidade subindo, a partir de julho de 2012, um W de 220 ou uma Estabilidade de 10 minutos para caracterizar trigo Pão. Com cultivares feitas para um patamar de qualidade (180 de W) precisávamos agora atingir um patamar mais alto, 220 de W. Além disto, seguíamos adubando como se nossa produtividade tivesse pouco evoluído. Como o nitrogênio é constituinte das proteínas e a frequente deficiência deste nutriente se refletiu na flutuação da qualidade de algumas cultivares mais produtivas como o Quartzo. Produzir Pão com pouca proteína é como produzir argamassa com pouco cimento – não funciona bem! Manejo de Nitrogênio (N) – chegou a nossa vez Observar porcentagem de proteína e manejar o cultivo com vistas a uma porcentagem mínima é algo corriqueiro em países mais tradicionais no cultivo de trigo como Canadá, França e Estados Unidos. Da experiência destes aprendemos que quanto mais alta a produtividade, menor tende a ser porcentagem de proteína e, portanto, menor a Força de Glúten. Com um níveis de produtividade e exigência em qualidade crescentes a eminência de dificuldades com a qualidade das cultivares disponíveis em nosso mercado se tornou evidente. Sendo assim, passamos a estudar os caminhos trilhados por estes países acima citados com a intenção de aprender o máximo possível com a experiência dos mesmos e tornar nosso aprendizado mais rápido e menos doloroso. Para nossa surpresa, alguns dos gráficos que mais nos ajudaram a entender o que acontecia aqui datavam de 1936, demonstrando o quão mais adiantada se encontra a pesquisa mundial neste tema. Aprendemos que não era necessário se preocupar com porcentagem de proteína quando nossos rendimentos eram baixos. No entanto, como já existem muitos agricultores produzindo acima dos 3.000 kg/ha e alguns chegando a 6.000 kg/ha os conceitos de manejo de N para qualidade passaram a fazer sentido e sua aplicação se tornou necessária em muitos casos. Neste ponto, cada instituição de pesquisa tomou um rumo, cada um possivelmente mais apropriado para a realidade de seu germoplasma. Na Biotrigo Genética optamos por trabalhar em duas frentes: (1) Manejo de N e (2) melhoria contínua das características que afetam a qualidade das cultivares. Com os requerimentos de qualidade mudando muito mais rápido que se pode mudar de cultivares, optamos por auxiliar as cultivares que estão no campo a produzir com qualidade indicando um manejo de N mais adequado. A indicação posta em prática na safra 2011 não se afasta muito da indicação oficial da Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo, mas vai além. Baseamos a indicação na produção esperada, calculando 30 kg de N para cada tonelada de produção esperada, padrão este utilizado em muitos países. Além disso, tratamos de que o N aplicado seja melhor distribuído no ciclo da cultura tendo em vista perdas que temos por excesso de chuvas na maior parte das áreas tritícolas. A indicação varia de região para região e pode ser encontrada de forma completa no site www.biotrigo.com.br. Em 2011 muitos agricultores ouviram falar da indicação e pelo menos no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e sul do Paraná tivemos muitos relatos de aumento do uso de N, muitas vezes de forma fracionada como indicamos. Felizmente os resultados práticos tem sido surpreendentes. A região Noroeste do Rio Grande do Sul que costumava ter problemas de qualidade teve excelente produtividade e qualidade de trigo. Técnicos da região atribuem a mudança em grande parte ao maior uso de N. Dentre os muitos trabalhos de manejo de N e seus efeitos optamos por trazer aqui o trabalho do Eng. Agr. Evandro Hefler da Cotrisoja, de Tapera, RS. Evandro acessou o efeito de cultivares, número de aplicações de fungicida e manejo de N no rendimento e na qualidade do trigo. A medida que aumentou a dose de N, o autor tratou de fracionar melhor a mesma. Observou-se resposta positiva em rendimento e qualidade para as três cultivares para melhor manejo de N, assim como para mais fungicida. Na figura que apresentamos aqui é possível observar o efeito sobre a qualidade. Com menos fungicida e menos N nenhuma cultivar conseguiu se enquadrar como Pão (W>220). À medida que melhoramos o uso de N e manejamos melhor as doenças, a qualidade vai melhorando, chegando a trigo. Melhorador em alguns casos. Estes resultados evidenciam o importante efeito do manejo da cultura sobre a qualidade. É excelente notícia que o manejo de N está funcionando bem. No entanto, precisamos seguir melhorando a genética para produzir mais qualidade com o mesmo N. Como exemplo de mais este avanço trouxemos dados da nova cultivar TBIO Iguaçu que é muito similar a Quartzo (é descendente deste) em rendimento e características agronômicas, mas tem apresentado consistentemente (vide figura) maior força de glúten. Entendemos que aliando manejo de N e melhoramento para qualidade poderemos continuar avançando para rendimento sem deixar de atingir a qualidade que precisarmos. Futuros avanços Certamente deixamos de mencionar algumas conquistas da triticultura, mas preferimos reservar este espaço para falar de avanços que vemos pela frente. Poderíamos escrever sobre transgenia que em trigo anda a passos lentos, uso racional do N (baseado em sensores), sistemas de monitoramento de giberela e brusone (www.sisalert.com.br), marcadores moleculares e outros avanços que estão chegando. No entanto, preferimos concentrar nossa atenção para algo talvez ainda mais sólido, a melhoria do perfil de nossos solos ácidos. Embora não sejamos especialistas, temos ouvido muitos apreciadores e estudiosos do tema falar da necessidade de corrigir a acidez de nossos solos em profundidade, não nos primeiro 3 cm. Talvez nos primeiros 20 cm, quem sabe nos 40 cm superficiais. Com este objetivo já ouvimos até mesmo defensores ferrenhos do plantio direto defender UMA ÚNICA LAVRAÇÃO em profundidade para incorporar calcário e descompactar, depois retornando ao plantio direto indefinidamente. Já vimos evidencias práticas suficientes para nos fazer acreditar nesta necessidade e no potencial que esta correção representa não só para o trigo, mas para todas as culturas que cultivamos em rotação como o trigo. Esperamos um dia poder citar também este avanço, como algo do passado. *Gerente de Negócios Biotrigo Genética, agrônomo PhD em Genética Vegetal


Por * André Cunha Rosa
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